Poucas carreiras são tão populares como a do marketing. Ainda assim, raramente vemos algum adolescente dizer “quero ser diretor de marketing de uma grande empresa”. Boa parte dos que acabam indo estudar marketing na faculdade acabam fazendo por achar maneiro ou porque não era um curso tão concorrido. Situação que não melhora nem quando esses jovens saem da faculdade, e permanecendo limitados à visão de que marketing é quase sinônimo de publicidade e social media.
Marketing é um curso relativamente novo (o que talvez ajude a explicar a preferência dos nossos pais pela medicina, advocacia e outras profissões antigas). A ESPM lançou seu curso de administração com ênfase em marketing, provavelmente o 1º do Brasil, em 1981. Isso foi 25 anos depois da primeira turma de administração de empresas da FGV. Em ambos os casos, fica claro que marketing é uma área da administração — uma ciência social com uma boa pitada de exatas. No entanto, durante a sua jornada rumo à fama, o marketing passou a se associar mais à comunicação do que à administração, porque era isso que o gerente de marketing fazia na maior parte do tempo na maior parte das empresas. Infelizmente, isso fez com que muitos dos conceitos entalhados em 1967, por Philip Kotler, fossem esquecidos no dia a dia desse profissional.
As pessoas sabem o que faz um médico cardiologista, um advogado tributário, um ortodontista, mas a maioria realmente não sabe o que faz um profissional de marketing. “Cuida da propaganda, né?”, indagaria uma pessoa comum. O pior é que não é apenas a minha mãe ou a sua que acha isso, mas muitos gestores e empresários que estão a frente de empresas conduzindo seus negócios diariamente. É propaganda, redes sociais e eventos. Tem a ver com a imagem da empresa é marketing. Mike Markkula, o cara que financiou a Apple, disse “empresas são comandadas pelo marketing, não pela engenharia”. Trinta anos depois e centenas de cursos e livros de marketing à disposição, a maioria dos gestores ainda acham que empresas são comandadas pela engenharia. Essa visão míope com astigmatismo faz a diretoria atribuir menor importância ao setor, o que resulta em menos investimento, profissionais pouco qualificados e, em grande parte das vezes, em uma empresa com grandes dificuldades de ganhar mercado e sobreviver a recessões.
O bom profissional de marketing começa por ter ótima compreensão do papel do marketing dentro da empresa. Ele sabe que está sob sua responsabilidade cuidar da:
- Satisfação do consumidor através de qualidade, serviço e valor
- Conquista de mercado através do planejamento estratégico
- Gestão das informações de marketing e mensuração da demanda de mercado
- Análise do ambiente de marketing (tendências, ambiente demográfico, econômico, sociocultural e tecnolog.)
- Análise dos mercados consumidores e comportamento do consumidor
- Análise dos concorrentes
- Identificação de segmentos de mercado e definição do mercado-alvo
- Diferenciação e posicionamento de mercado
- Desenvolvimento de novos produtos e estratégia de preço
- Administração das estratégias do ciclo de vida do produto
- Estratégias para nichos e para o mercado global
- Administração de linhas de produtos e suas marcas
- Administração de propaganda, promoção de vendas, RP, marketing direto e digital
É claro que dependendo das características da empresa, não há necessidade de fazer tudo isso. O importante aqui é saber que existe e que cada um desses tópicos desdobra-se em uma grande quantidade de conteúdo, com conceitos, diagramas e métricas próprias que ajudam na gestão. Vamos lembrar as sábias palavras de Peter Drucker (sem ele, não haveria marketing): “se você não pode medir, não pode gerenciar”.
Encontrar um profissional de marketing com uma visão estratégica é tão complicado que é comum vermos economistas e até engenheiros ocupado os cargos mais altos em grandes empresas, algo que chamou minha atenção vários anos atrás ao ler minhas primeiras Exame. “Como assim? Um economista diretor de marketing da Nike?”. Ingênuo, demorei a entender a razão.
Profissionais com formação em marketing tendem a ter uma visão limitada dos negócios e, frequentemente, ignoram ou não buscam entender aspectos mais técnicos (chatos mesmo) da gestão de empresas, como logística ou finanças. Kevin Lane Keller chama isso de marketing holístico, uma visão do todo capaz de proporcionar uma noção ampla do negócio e unir o marketing às outras áreas da empresa.
O bom profissional de marketing precisa tem uma boa noção de como tudo funciona, além de se manter próximo dos outros departamentos. Uma das tarefas do marketing é saber explorar aspectos positivos convertendo-os em vantagem competitiva para a empresa, e a única maneira de fazer isso é estar por dentro de tudo. Muitas vezes, oportunidades de inovação estão escondidas dentro da empresa, mas fora do departamento de marketing. Conhecer e se manter conectado com os outros setores é uma grande maneira de não deixar passar boas ideias.
Criatividade é importante, mas é para isso que agências de publicidade servem e empresas pagam um bom dinheiro nelas. Deixa que elas trabalhem! O que é realmente importante é ter um extraordinário filtro e critérios mais sólidos do que “gostei” e “não gostei”. Espírito inovador e coragem para brigar pelas novas ideias são duas coisas indispensáveis. Outras qualidades do business em geral também são muito apreciadas: saber ouvir, gostar de aprender, planejar, ter iniciativa, saber se relacionar e ser político quando necessário. Mas não estamos falando do profissional perfeito, então ter metade delas já é o suficiente para se dar bem no mercado.
É preciso ter isso muito claro: marketing não é design, não é propaganda, não é organização de eventos, não é gestão de redes sociais, mas é tudo isso e muito mais. É também um pouco de RH (já que é preciso ter profissionais motivados para manter clientes satisfeitos), é finanças (para saber quanto é necessário vender para cobrir o investimento), é gerenciamento de projetos (para assegurar que o produto esteja no mercado de acordo com a demanda e nenhuma etapa seja esquecida). Sinto lhe dizer, mas agora vem a parte chata do marketing. Ela existe e, ao contrário do que muitos ainda pensam, não é o departamento da sombra e água de coco, é uma área onde mais cabeças rolam e profissionais ficam menos tempo, mostrava um estudo que vi algum tempo atrás.
No marketing há uma porção de conceitos e ferramentas que todos os profissionais deveriam conhecer, e mais alguns outros que podem ajudar gestores a tornarem suas empresas muito mais competitivas. A parte ruim é que é precisa estudá-las já que muitas envolvem cálculos e diagramas. A boa notícia é que não é nenhum teorema de Fermat e o Excel faz a maior parte do trabalho (sim, bons profissionais de marketing sabem usar Excel).
Para finalizar este artigo sobre o lado menos glamouroso do marketing, fiz mais uma pequena lista de algumas das métricas importantes empresas deveriam estar aplicando pelo menos metade delas no seu dia a dia. Mas claro que, para isso, é preciso existir um DEPARTAMENTO de marketing e não apenas um “puxadinho”, como é mais comum no mercado.
Métricas importantes de marketing
- Taxa de satisfação do cliente
- Taxa de aderência
- Lucratividade direta do produto
- Taxa de conversão
- Taxa de abandono (churn)
- Lembrança de marca
- >Custo médio de retenção
- Valor presente líquido
- Retorno (o tempo que leva e o valor que gera)
- Taxa Interna de Retorno
- Análise do valor do cliente (CLV)
- Custo por clique
- Taxa de devolução
- Boca a boca
Existem dezenas delas, porém nem todas aplicáveis a todos os tipos e tamanhos de empresa. A lista acima contém as mais importantes citadas no livro “Data-Driven Marketing”, do Mark Jefferey, que explica 15 das mais importantes métricas de marketing. Para não matar os leitores de tédio, não coloquei as fórmulas. Para saber mais, sugiro o livro “Métricas de Marketing” que é um pouco mais completo e possui versão em português.